quarta-feira, 24 de junho de 2009

Devaneios... [Parte 1]

Naquela noite tudo estava diferente, parecia fúnebre. Era o espetáculo. Um grande ilusionista apresentava-se naquele momento; dizem que veio de longe. De onde? Parece que do país vizinho; acho que... decididamente é Irlandês. É, era o que dizia no cartaz. Não faz muita diferença. São todos iguais.
Na manhã seguinte não se falava em outra coisa, senão o ponto alto do espetáculo, o grand finale, a obra prima... Num alvoroço de luzes e vozes e fumaça, eis que o inesperado toma a forma de um jovem, tez clara, abatido, roto, típico garoto de rua; 'Não era aquele rapaz? Aquele que nos deixou a alguns dias?', 'Pois parecia'. Fora estrangulado. Não se sabe que mente complexa teria planejado tal atrocidade; sabe-se, sim, que o garoto era figura conhecida, frequentava as mais movimentadas ruas da cidade, pedia dinheiro. Uma tentativa de prolongar, mesmo que minimamente, sua estadia no plano intermediário, também chamado de vida. Para alguns: o pré-inferno.

Do outro lado da cidade, num porão igualmente desprovido de grandes recursos, dois homens permaneciam suavemente aflitos, talvez tensos, após uma longa conversa; iluminados pela chama titubeante da vela. 'Fecha aquela torneira, está me matando', 'Fecha você!'.
Num deles já notava-se pequenas mexas de fios prateados querendo fugir por entre os escuros, era sujeito magro, estatura mediana. No outro prevaleciam os ares de meia idade, ainda com um pouco de energia de reserva.
- Já parou pra pensar no que isso pode acarretar? E se eles nos...
- Esquece isso, já disse. Relaxa.
Na televisão de tubo passava um daqueles Westerns americanos em sépia, o que dava um ar benevolentemente nostálgico ao lugar; ainda contavam com uma garrafa vazia de Duff ao lado da TV. Aquilo certamente ajudava na composição da cena.

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